15/12/2011

Se eu escrever aqui, talvez o sono volte. Sempre surgem essas noites ruins, tudo só é efêmero e outras coisas difíceis de lidar.
Vem muitas imagens juntas e duram muito tempo as emoções, o que tem de concreto dura pouco e deixa esse saudosismo que se torna um pouco morte.
Hoje, além do saudosismo, sinto uma falta de amor enorme, tenho amigos pra quem posso até pra fazer cara áspera, se não tivesse seria igual ao homem da Artur Alvim, que decidiu morar na rua e parar de fazer miniaturas de parques de diversão.
Mas hoje entendi outra vez que não existe amor incondicional, todo mundo deve saber disso, mas sempre é difícil perder um amor que dizem ser inerente, é como não ter casa, mesmo que o perca só por alguns dias.
Com essa falta de amor, vem muita culpa, posso tentar fazer uma lista das palavras secas que disse, da ausência do meu olhar egocêntrico pra ela, meu descaso, mas parece ser uma coisa maior, um cansaço de amar.
Pode ser que muito disso seja pra colocar na coleção de crises e não existam tantas incoerências e olhares.
Se minha cabeça ficasse em silêncio junto com o mundo, talvez eu não me rasgasse hoje pra tirar esse monte de vidas ruins daqui de dentro.

07/12/2011

Corpo no mar

Deitou corpo sobre mar avermelhado
Lançou braços roxos soltos
Ar azul cheirava sol enferrujado
Tratou boiar escuridão cega
Pensamentos brancos pesados
Peito aberto jorrava pus esverdeado
Anos passados cinzas obscureceram
Penoso espaço anil respirava invisível
Mundo melancólico marrom terra
Dentes riam dourados na boca sabotada
Girava feito hélice, águas queimadas
Todo o esforço, vácuo férreo de vida tragada
Morreu, acordou bolha, odor verão enrugado
 
Robson C. Alkmim

05/12/2011

As partidas de Rimbaud


 
 
PARTIDA
Farto de ver. A visão que se reecontra em toda parte.
Farto de ter. O ruído das cidades, à noite, e ao sol, e sempre.
Farto de saber. As paradas da vida. – Ó Ruídos e Visões!
Partir para afetos e rumores novos.
O francês Arthur Rimbaud, nascido em 1854, sempre foi um homem de partidas, criando ao seu redor muitas histórias verídicas e outras fantasiosas até a sua morte com apenas 37 anos num hospital em Marseille. Rimbaud abandonou a poesia aos 19 anos e, na vida adulta, procurou se estabelecer com trabalhos fixos. Ele se alistou como soldado no Exército Colonial Holandês na Indonésia, voltou para a França, foi para o Chipre trabalhar de capataz numa empresa de construção, depois passou alguns anos no Iêmen e, na Etiópia, onde foi mercador e vendia, entre outras coisas, café e armas. Foi também um grande colecionador de mulheres por onde passou.
Por esse período notável de aventuras, já seria uma grande personagem para qualquer escritor ou diretor de cinema. Mas Rimbaud foi um adolescente prodígio, um dos pilares da poesia e prosa poética, e que influenciou um sem número de poetas no século XX, como também os movimentos de contracultura, chegando a ser transformado num ícone popular, com grafites com sua imagem espalhados por cidades no mundo.
Rimbaud escreveu entre os 15 e 19 anos, para o espanto dos poetas e da sociedade francesa da época. Sua poesia é invariavelmente comparada à sua personalidade explosiva. Ele gostava de se vestir de maneira extravagante, conservando uma longa cabeleira. Foi de suma importância o reconhecimento de alguns poetas simbolistas, como Malarmé, Valéry e Verlaine, para alavancar o mito de Rimbaud.
À esquerda Paul Verlaine e Rimbaud ao centro
Após uma troca de cartas com Verlaine para expor seu trabalho ao poeta, iniciou-se uma profunda admiração do mais velho sobre o mais novo, deu-se num romance entre os dois, trazendo muitos problemas para ambos, já que Verlaine era casado e com um filho. Eles viveram sob pobreza por várias cidades européias. Verlaine, alcoólatra, num acesso de loucura disparou contra Rimbaud, que foi ferido no joelho, caso que só piorou sua saúde durante os anos seguintes. Verlaine foi preso por dois anos.
Além dos poemas espalhados durante seus anos de poeta, ele tem duas obras principais: “Uma temporada no inferno”, em prosa poética, onde Rimbaud procura suas origens em terras distantes e pelo conhecimento, marco do simbolismo e, em “As iluminações”, com 42 poemas em versos livres, o que foi um escândalo para os franceses tradicionalistas por natureza.
Rimbaud em Áden, no Iêmen, em 1880 e o adolescente
Talvez o melhor tradutor de Rimbaud para o português tenha sido o grande Augusto de Campos, para ele:
“Rimbaud é, sem dúvida, um dos grandes inovadores da linguagem poética, na raíz da Modernidade… desestabiliza a semântica poética com as associações insólitas de sua imaginação e a violência do seu vocabulário, corrói os limites entre prosa e poesia, consciente e inconsciente, e prepara as investidas da parataxe que caracterizarão o discurso poético moderno.”
Rimbaud, o inquieto, o anárquico, o bon amant, o boêmio, o gênio, transformou cada partida para uma nova experiência num poema eterno.
Minha boêmia
(Fantasia)
Lá ia eu, de mãos nos bolsos descosidos;
Meu paletó também tornava-se ideal;
Sob o céu, Musa, eu fui teu súdito leal,
Puxa vida! a sonhar amores destemidos!
O meu único par de calças tinha furos.
– Pequeno Polegar do sonho ao meu redor
Rimas espalho. Albergo-me à Ursa Maior.
– Os meus astros no céu rangem frêmitos puros.
Sentado, eu os ouvia, à beira do caminho,
Nas noites de setembro, onde senti qual vinho
O orvalho a rorejar-me a fronte em comoção;
Onde, rimando em meio a imensidões fantásticas,
Eu tomava, qual lira, as botinas elásticas
E tangia um dos pés junto ao meu coração!